2013/03/28

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As Crônicas de Charn [Cap.XIII]

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Classificação indicativa: Não recomendado para menores de 16 anos.
As Crônicas de Charn Apocalipse: — Marionetes do medo [Cap. XIII]


Quando o órfão abriu os olhos, duvidou que o tivesse feito, porque tudo continuava tão semelhante a um pesadelo como antes de abri-los. O rapaz unicamente pensava nas palavras ruidosamente ensurdecedoras, originadas pela provocadora Lenir. — não havia dúvida que se tratava da própria, principalmente após arrastar-se exuberantemente a alguma claridade próxima, a dança do clarão de um farol de bolso nas esbeltas trevas. — “Chega! Chega! Parem de uma vez por todas!”, implorava silenciosamente a criança, pelo término de tamanha dor; em vão. As circunstâncias levariam qualquer um a relembrar dias de liberdade, mas já não era possível: tais momentos pareciam tão distantes, como pertencessem a outra vida e geração. O pobre menino compreendeu, então, que a D.O.P.S gera aflições em seus convidados, a principio, para depois enlouquecê-los, introduzi-los em um universo paralelo de tristeza, sem tréguas.



O guarda que encaminhava o prisioneiro enfim selecionou a chave correta entre tantas outras de uma seleta prateada. O homem corpulento avançava indelicadamente, preparado para despejar o garoto no pequeno cubículo. O trabalho não foi finalizado: Eli empurrou a sentinela, com toda a força que lhe restava. Num tombo desajeitado do patrulha, o jovem agarrou-se a cela e, na ausência da racionalidade, começou a derrubar lágrimas sinceras que brilhavam ao encontrar o ferro enferrujado, sucedidas por gritos desesperados, ecoando corredor afora. 



— Vadia! Pagará! — praguejou o jovem, que tinha consigo a obrigação de sair dali. Constatou o dever de fazer algo, por mais estúpido e sem nexo. — Abram! Por que ousa zombar meus pais, vadia? Abram! Você é a responsável pela minha angústia! É você! Pagará! Chega! Chega! — mal acabara de pronunciar e Eli se viu sentado e ainda abraçado fortemente às barras da cela, em um choro profundo, um choro de misericórdia. — Eu quero a morte, por favor. — Garanto que até o mais rude dos homens lastimaria a situação. 



O estrondo da abertura do portão da gaiola fora trovejante. Mais trovejante ainda fora o choque do órfão a parede de fundos da cela, devido à brutalidade do patrulheiro, muito irritado pela sua queda. Assim, digo-lhes: finalmente. Já não havia sequer a iluminação de uma tocha e o menino encontrava-se frente a frente da fonte de sua ira, ainda destacada pelo fulgor verde de seus olhos. Não nego a inexistência de qualquer força no garoto, porém nos minutos de fúria, encontramos o ardor do espírito, adquirimos energias além da compreensão, para incluir um fim na cobiça pela vingança. Com o cativo 863 não foi diferente. Logo, levantou-se ao apoio da parede a seu lado e, sem o poder do tato e muito menos o da visão, saltou para em cima da luz esverdeada. 


— Ridículo. — advertiu Lenir, após desviar-se nas sombras e avaliar, com desprezo, a queda do rapaz no chão de pedra, que colidiu a coluna com um dos pés da disputada cama velha e quebrada, situada no canto direito do aposento. A mulher permanecia firmada em um de seus joelhos e deslizando as mãos macias em todo seu corpo nu. — Menino, menino, não percebe que essa sua fome incontrolável o atrapalha? Pouco me importo pela sua dor. Aliás, por que está selvagem? Não passa de um fajuto, miserável... Venha, seja preciso, não distribua ao alheio toda essa ingratidão. Concentre-se no alvo, em mim. Ou quer terminar igualmente a seus pais, que nem auxiliam e protegem seu próprio filho? Vamos, vamos, vamos. Estou louca para ter suas mãos fracas golpeando meu indefeso corpo.

Enganam-se aqueles que acreditam na hesitação do garoto. Eli se reergueu e novamente adiantou-se a golpes, na tentativa de acertar a desafiadora; golpes tortuosos, irregulares e cansados, dificilmente executados com perfeição mediana, graças às condições de nulo favor. Todavia, fracassou. Desabou depois do contra-ataque ágil, um movimento fatal de torção de braço e pontapés certeiros no dorso adversário. 

Posterior a um silêncio desagradável, Lenir abaixou-se junto ao órfão retorcido e sussurrou de maneira triunfante. — Covarde. Aprenda a brincar com seus oponentes através do ambiente cor de abismo. A escuridão deve ser um recurso eficiente. Talvez sua família seja incapaz de tal feito. É uma pena... Pouco se preocupe, é de sangue, concluo que nunca será alguém em combate. – Insatisfeita, iniciou uma ordem de acariciamentos na lisa, apesar de relevada e sangrenta, cabeça da criança. — Pobrezinho. Pobrezinho. Entendo você, livro-te a culpa de ter perdido o caminho de casa.


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NOTA: A história tem como base a crônica "The Magician's Nephew" do escritor C.S.Lewis; nesta, o mundo Charn é citado.

Idealizado por Rodrigo Carvalho;
Escrito por Luis Henrique;


Enfim todos poderão ter "As Crônicas de Charn: Apocalipse" em mãos. Próximo ao término das postagens de capítulos aqui, no Skandar Keynes BR, será publicado o livro desta renomada história.  Aguardem novidades.

Todos os direitos reservados: Luis Henrique e Rodrigo Carvalho.
Qualquer tentativa de plágio do conteúdo, acarretará a rigorosas punições aos valores autorais.


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